Autoria:
Márcia Gabrielle Brito Mascarenhas
CC:
Experiências do sensível
Foi
em 2011. Mudei-me para a cidade de Ilhéus, mais precisamente para o bairro
Salobrinho. Precisava de um lugar calmo, tranquilo, um lugar de acolhimento. E
encontrei muito mais. Encontrei grandes amigos, encontrei paz e o mais
importante: conexão com a terra. Quando cheguei a casa em que moro, meu quintal
era cimentado, um grande quintal cimentado. Aquilo me inquietou. Mas no meio
daquela “cimentadura” toda, havia uma fresta de terra, e foi ali que fiz
morada. Peguei umas sementes de tomate e coloquei na terra. Ouvia coisas do
tipo: Isso não vai funcionar! Onde já se viu nascer uma planta no meio de tanto
cimento? A terra está desgastada! Mas eu sempre acredito que a terra é nossa
amiga, e a força que tem nela, é equivalente a força que nós temos para que ela
vença. O pé de tomate deu seu pequeno broto, e foi crescendo, mas cresceu
tanto, que tinha tomate para dar e vender. Partilhamos tomate com nossos
vizinhos, com familiares, com amigos, com desconhecidos. Todos queriam ver
aquele pé de tomate que brotou no cimento. As pessoas não acreditavam. Era
lindo. Era pouco pra mim. Queria um quintal de verdade, igual aqueles de
filmes, como um grande jardim. Decidimos ir arrancando alguns pedaços de
cimento, através daquela abertura estreita que tinha se brotado o tomate. Algumas
sementes de abóbora foram plantadas, e cabe aqui frisar que esse pé de abóbora
foi extremamente peculiar, ele só dava abóbora de cinco em cinco, não adiantava
pedir mais, quando tirávamos as cinco aboboras, outras cinco começavam a
crescer. Plantamos algumas sementes de couve, depois plantamos cana de macaco,
alecrim. Depois veio nosso grande feito. Até hoje a explicação para isso é
confusa, uns dizem que foi coisa de passarinho, mas eu acredito que a terra dá
o que a gente precisa. Plantamos um pé de romã em nossa casa, e por vezes íamos
conferir, até que o tronco foi crescendo e as folhas foram surgindo, então
quando vieram os frutos, surgiu uma linda goiabeira. Brotaram sorrisos. A
goiabeira foi incrível em nossa vida. Foi fundamental. Mais uma vez aconteceram
muitas partilhas, muitas trocas, muitos saberes. Plantamos cebolinha,
manjericão, rúcula, hortelã grosso, miúdo, rosas. Quando pensávamos que não
havia mais nada de peculiar para acontecer ao nosso plantio, eis que plantamos
milho, eles começaram a crescer, e conforme cresciam, era estranho notar que a
espiga ao invés de sair no caule, saia no pendão. Plantamos muito. Mas o mais
importante para mim dessa terra, desse processo de plantio foi a colheita.
Colhi em mim o amor pelo plantio, o cuidado com as plantas, o diálogo com elas
e a certeza de retorno. Colhi visitas de lindas borboletas, passarinhos
cantantes e lagartixas amorosas. Aprendi que a delicadeza existe em mim, eu que
tantas vezes pesada com as mãos, aprendi a manusear a terra, aprendi a acordar
com essas crianças sorridentes que tantas vezes encheram minha casa com cheiros
e sabores, minha cozinha com misturas e temperos, mas o melhor tempero mesmo é
o que a terra dá.
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