domingo, 29 de julho de 2018

(ES) Diário Sonoro

julho 29, 2018 0 Comments

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Autoria: Márcia Gabrielle Brito Mascarenhas
CC: Experiências do sensível

09:20
Vassoura passeando pelo espaço. Pássaros cantando. Cachorros latindo. Portão abrindo ao longe.
 Mais pássaros. Mais vassouras. Barulho de objetos sendo empurrados. Barulho do celular vibrando com uma nova mensagem. Som do vento.

10:20
Pessoas conversando na rua, barulho de batidas. Latido. Pessoas vendendo coisas na rua, pássaros. Ouve-se um: “bom dia, minha amiga...hoje?”. Batidas de palmas. Pessoas gritando: “ô da casa!!” Pássaros. Criança chorando. Mais pessoas falando.

11:20
Pássaros. Pessoas falando ao longe. Vibração do celular. Barulho de moto. Mais vibração. Pássaros compõem os diálogos entre as pessoas. Mulher grita: Diego!! Passos de pessoas pela rua.

12:20
Sons estranhos. Diego continua a ser chamado. Passos sobre folhas. Vibração do celular. Pássaros e sons do vento.

13:20
Barulho de ferro caindo. Pessoas conversando ao longe. Sons leves de ferro. Uma mãe adverte uma criança. A criança chora. Mais sons de ferros se chocando com o chão. Mais pessoas conversam.

14:20
Espirro. Pássaros. Sons do vento. Música ao longe. Batidas. Mais pássaros. Conversas ao longe.

quarta-feira, 4 de julho de 2018

(ES) Ano de renascimento

julho 04, 2018 0 Comments

Autoria: Márcia Gabrielle Brito Mascarenhas
CC: Experiências do sensível




Foi em 2011. Mudei-me para a cidade de Ilhéus, mais precisamente para o bairro Salobrinho. Precisava de um lugar calmo, tranquilo, um lugar de acolhimento. E encontrei muito mais. Encontrei grandes amigos, encontrei paz e o mais importante: conexão com a terra. Quando cheguei a casa em que moro, meu quintal era cimentado, um grande quintal cimentado. Aquilo me inquietou. Mas no meio daquela “cimentadura” toda, havia uma fresta de terra, e foi ali que fiz morada. Peguei umas sementes de tomate e coloquei na terra. Ouvia coisas do tipo: Isso não vai funcionar! Onde já se viu nascer uma planta no meio de tanto cimento? A terra está desgastada! Mas eu sempre acredito que a terra é nossa amiga, e a força que tem nela, é equivalente a força que nós temos para que ela vença. O pé de tomate deu seu pequeno broto, e foi crescendo, mas cresceu tanto, que tinha tomate para dar e vender. Partilhamos tomate com nossos vizinhos, com familiares, com amigos, com desconhecidos. Todos queriam ver aquele pé de tomate que brotou no cimento. As pessoas não acreditavam. Era lindo. Era pouco pra mim. Queria um quintal de verdade, igual aqueles de filmes, como um grande jardim. Decidimos ir arrancando alguns pedaços de cimento, através daquela abertura estreita que tinha se brotado o tomate. Algumas sementes de abóbora foram plantadas, e cabe aqui frisar que esse pé de abóbora foi extremamente peculiar, ele só dava abóbora de cinco em cinco, não adiantava pedir mais, quando tirávamos as cinco aboboras, outras cinco começavam a crescer. Plantamos algumas sementes de couve, depois plantamos cana de macaco, alecrim. Depois veio nosso grande feito. Até hoje a explicação para isso é confusa, uns dizem que foi coisa de passarinho, mas eu acredito que a terra dá o que a gente precisa. Plantamos um pé de romã em nossa casa, e por vezes íamos conferir, até que o tronco foi crescendo e as folhas foram surgindo, então quando vieram os frutos, surgiu uma linda goiabeira. Brotaram sorrisos. A goiabeira foi incrível em nossa vida. Foi fundamental. Mais uma vez aconteceram muitas partilhas, muitas trocas, muitos saberes. Plantamos cebolinha, manjericão, rúcula, hortelã grosso, miúdo, rosas. Quando pensávamos que não havia mais nada de peculiar para acontecer ao nosso plantio, eis que plantamos milho, eles começaram a crescer, e conforme cresciam, era estranho notar que a espiga ao invés de sair no caule, saia no pendão. Plantamos muito. Mas o mais importante para mim dessa terra, desse processo de plantio foi a colheita. Colhi em mim o amor pelo plantio, o cuidado com as plantas, o diálogo com elas e a certeza de retorno. Colhi visitas de lindas borboletas, passarinhos cantantes e lagartixas amorosas. Aprendi que a delicadeza existe em mim, eu que tantas vezes pesada com as mãos, aprendi a manusear a terra, aprendi a acordar com essas crianças sorridentes que tantas vezes encheram minha casa com cheiros e sabores, minha cozinha com misturas e temperos, mas o melhor tempero mesmo é o que a terra dá.